Após a OMS, Organização Mundial de Saúde, ter declarado a pandemia do COVID-19 e, ainda, alguns Governos Estaduais e Municipais terem decretado estado de calamidade pública, muitas incertezas e inseguranças tomaram conta do dia-a-dia dos brasileiros e da população mundial.
Nesse contexto atual, as relações de consumo foram muito impactadas, uma vez que, no período da quarentena, decretou-se o fechamento de estabelecimentos comerciais e suspensão de muitos serviços e fornecimentos, salvo aqueles considerados essenciais, como por exemplos: mercados, farmácias e postos de combustível.
O momento enfrentado pela humanidade, provocada pela COVID-19, revela um caso fortuito ou de força maior, previsto no Código Civil, em seu artigo 393.
Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.
Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.
Esta é uma situação inevitável, que poderia até ser prevista, mas não poderia ser impedida. A pandemia que se espalhou pelo mundo não respeitou fronteiras, alastrando-se com uma velocidade incontrolável.
É uma situação transitória, sim, mas que tem perturbado todas as relações, inclusive as consumeristas. Nesta última, os casos fortuito e de força maior são hipóteses de exclusão da responsabilidade civil, extinguindo assim o dever de indenizar. No entanto, assim como o consumidor tem o direito de notificar o fornecedor, em virtude de acontecimentos excepcionais e imprevisíveis, igualmente podem as empresas exercer este mesmo direito em suas relações comerciais.
Com o intuito de preservar o equilíbrio nas relações de consumo, os PROCONS estão trabalhando, incansavelmente, a fim de garantir a equidade nas relações consumeristas, pois, mesmo as empresas não sendo responsabilizadas pelo prejuízo, o consumidor é a parte vulnerável da relação, devendo, portanto, ser protegido, buscando sempre um equilíbrio nas negociações.
Algumas práticas, com o intuito de proteger o consumidor, estão sendo tomadas no âmbito nacional, como é o caso da Medida Provisória n° 925 de 18 de março de 2020, onde o Governo Federal adotou algumas medidas emergenciais para a aviação brasileira, estabelecendo em seu artigo 3º, § 1º, que os consumidores ficarão isentos das penalidades contratuais, por meio da aceitação de crédito para utilização no prazo de doze meses, contado da data do voo contratado.
No entanto, existem serviços que não podem ser adiados, são os conhecidos serviços de trato sucessivo, onde temos, como exemplo, os serviços educacionais.
Para estes serviços, é importante avaliar se será possível a continuidade de sua prestação, por meio de recuperação das aulas, ou da utilização de ensino à distância, pois, em sendo possível o cumprimento do serviço contratado, não terá, o consumidor, direito ao cancelamento do contrato ou abatimento de mensalidade.
Como se não bastasse toda a insegurança gerada pela pandemia, muitos consumidores, após a divulgação do surto e divulgação das medidas de higiene que deveriam ser adotadas pela população, para o controle da doença, se depararam com a escassez de alguns produtos nas prateleiras dos estabelecimentos comerciais, o que fez com que muitos comerciantes atribuíssem um valor abusivo a eles, como foi o caso do álcool gel, máscaras e luvas descartáveis.
Esta elevação dos preços, de forma unilateral e injustificada, em razão, simplesmente, do aumento da procura dos consumidores por estes produtos, é considerada prática abusiva, principalmente porque os comerciantes sabem da essencialidade que tais produtos exercem no combate à pandemia e se utilizam disso para elevar seus lucros. Tal prática é vedada ao fornecedor, como previsto no Código de Defesa do Consumidor (CDC), em seus artigos 39 e 51, os quais seguem:
Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:
(…)
V – exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;
(…)
X – elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços. (…)
Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
(…)
IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade;
(…)
X – permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral;
Cada caso é um caso, e cada contrato deve ser analisado em suas particularidades, verificando, principalmente, se existe, em suas cláusulas, previsão de cancelamentos, penalidades e, inclusive menção aos casos fortuitos e força maior. Quando o contrato prevê a possibilidade de cancelamento ou remarcação, deve-se levar em conta a regra contratual, onde muitas vezes há o abatimento de multas e taxas administrativas.
Embora em muitos casos a multa contratual não seja devida, o pagamento pelos serviços prestados até o momento da rescisão, deverá ser observado, garantindo o mínimo de equilíbrio contratual e velando o não empobrecimento indevido do fornecedor.
É essencial saber que este cenário de incertezas e insegurança é passageiro, no entanto, seus efeitos ainda serão sentidos por tempo indeterminado. Frente ao risco de não receber, ou de não conseguir cumprir seus contratos, consumidores e fornecedores, devem priorizar o bom senso, onde todos devem ter cautela e serenidade. Lembrando que ambos, fornecedores e consumidores, são vulneráveis frente esta doença que assola o mundo e, portanto, merecem proteção.
Permanecemos atentos às diretrizes e demais atos emanados do Poder Público e órgãos reguladores com o objetivo de manter nossos clientes orientados sobre a melhor forma de aplicação de todas as medidas que se referem às relações de consumo.
Por: Karina Busnello Andreoli
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