No último domingo (13/08), veio à tona o caso envolvendo a atriz e cantora Larissa Manoela e a representação societária de seus bens, até então exercida pelos pais. Afora as questões particulares, delicadas e complexas envoltas ao imbróglio, a situação exposta pela atriz em cadeia nacional, também, trouxe uma série de reflexões acerca do mundo jurídico-empresarial.
A primeira delas é sobre o poder familiar. É incontroverso que por deterem o poderio familiar, os pais devem representar os filhos menores de 16 (dezesseis) anos e assistir aqueles que possuem entre 16 (dezesseis) e 18 (dezoito) anos de idade, competindo a eles a administração dos bens dos menores, até que atinjam a capacidade civil plena, seja pela maioridade ou pela emancipação.
Vale dizer que a lei igualmente prevê limites à gestão dos bens dos menores, de maneira a preservar o patrimônio desses, não podendo os pais onerá-los ou diminuí-los. A este respeito, o artigo 1.689 do Código Civil Brasileiro, preleciona:
Art. 1.689. O pai e a mãe, enquanto no exercício do poder familiar:
I – são usufrutuários dos bens dos filhos;
II – têm a administração dos bens dos filhos menores sob sua autoridade.
Contudo, em que pese a determinação legal quanto à necessidade de representação dos menores, no caso sob análise, em que houve a constituição de uma empresa, sob a forma de sociedade limitada, abarcando todo patrimônio e ativos com origem no trabalho da, há época da constituição, menor, não é necessário que os pais figurassem como cotistas dessa empresa, vez que esses funcionariam apenas como usufrutuários dos bens da filha e a responsabilidade destes restaria limitada ao dever de administrar (com zelo) os bens, representando-a ou assistindo-a nos atos da vida civil.
Obviamente, considerando que os pais teriam abdicado da vida profissional para se dedicarem à carreira da filha, poderiam estes, alternativamente a um valor de remuneração mensal, tornarem-se sócios desta sociedade, ponderando as cotas sociais, obviamente, ao papel exercido por cada um dentro da organização e patrimônio inicial incorporado por cada parte.
Frisa-se que na primeira empresa constituída, detentora até hoje do maior acervo patrimonial, os pais da atriz detêm 98% (noventa e oito por cento) do total das cotas, não se confundindo com representação dos interesses da filha enquanto menor.
As cotas sociais de uma empresa, em verdade, representam o patrimônio da organização e refletem diretamente no percentual de propriedade que cada sócio tem sobre esta. Uma vez que não há participação dos pais na formação do capital social da empresa, a esses enquanto representantes de seus filhos menores, não poderiam integrar o quadro societário da empresa, mas, apenas, representá-los legalmente na administração dessa sociedade. Podendo, ainda, enquanto administradores, usar, gozar e dispor dos frutos advindo desta sociedade, mas sempre preservando o patrimônio do menor representado ou assistido.
Entretanto, como referido acima, no episódio envolvendo a atriz Larissa Manoela, em análise inicial, aparentemente criou-se um desenho societário que implicou na transferência de patrimônio da, na época, menor aos pais, já que as empresas foram constituídas em nome de todos, sendo que todos os valores devidos à atriz passaram a ser recebido por essa empresa, da qual ela possuía a participação societária ínfima de 2% (dois por cento).
Dessa forma, como todo o patrimônio e ativos financeiros eram inseridos dentro da empresa, possivelmente figurando esta como contratada, nas relações comerciais envolvendo a atriz, os pais, na qualidade de sócios e não representantes do patrimônio da filha, movimentavam livremente os bens, não se limitando às responsabilidades e limites impostos quanto à administração destes, já que, em tese, os bens era, na proporção de 98% (noventa e oito por cento) pertencentes aos pais e 2% (dois por cento) à atriz.
Com isso, vale lembrar que a lei brasileira prevê ser prevalente o disposto no contrato entabulado entre as partes, desde que preenchidos os requisitos legais. Caso contrário, identificado qualquer vício de consentimento, como no caso envolvendo um menor, em que a vontade é exercida pelos pais, o negócio jurídico, seja um contrato ou a constituição de uma empresa, abre espaço para questionamentos, podendo ser revisto ou até mesmo anulado.
Raquel Silvestrin
OAB/RS 95. 744