Foi aprovada pela Câmara dos Deputados no dia 07/07/2023 a PEC 45/2019, chamada Primeira Parte da reforma tributária, a qual tem por maior proposta a simplificação do sistema tributário brasileiro. O texto agora segue para o Senado.
Inicialmente convém mencionar que a reforma foi aprovada em apenas uma das etapas do processo legislativo, necessitando passar pela análise do Senado Federal e pela publicação da Emenda Constitucional. Então, o primeiro ponto a ser observado pelo empresário é que a reforma ainda não está vigente e pode passar por mais mudanças no Senado Federal. Sem querer explorar os liames do processo legislativo, mas somente para explicação do contexto, se o Senado Federal modificar o texto aprovado na Câmara (incluir algum artigo, por exemplo), essas modificações serão analisadas novamente pelos Deputados Federais, ou seja, podemos ter muitos capítulos nesta matéria.
Pelo projeto, são unificados cinco impostos (03 federais, quais sejam, o IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados, a contribuição para o PIS/Pasep -Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público e a COFINS – Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social; 01 de nível estadual, o ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços de Transporte Interestadual e de Comunicação, e 01 de nível municipal, o ISSQN – Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza) transformando-os em um Imposto sobre Valor Agregado (IVA), o qual será dividido em dois:
– A chamada Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), em substituição ao IPI, PIS e a COFINS, com arrecadação destinada à União, e
– O chamado Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), em substituição ao ICMS e ISSQN, com arrecadação destinada aos estados e municípios.
O formato de tais tributos unificados é de não cumulatividade, incidindo apenas sobre o valor agregado em cada etapa da cadeia produtiva.
A cobrança será efetuada pelo local de destino, onde o produto ou bem é usufruído. Atualmente, em regra a cobrança é efetuada pelo ente arrecadador da origem do bem ou serviço. O propósito de tal mudança é acabar com a guerra fiscal entre os estados, bem como diminuir a burocracia e o contencioso do atual sistema tributário vigente, além de promover redução nos custos operacionais das empresas.
Com a nova modalidade de cobrança do imposto relacionados a bens e serviços – IBS passando a ser no destino, e evitando o prejuízo de arrecadação de estados de vocação produtora, e também os menos populosos, haverá mecanismo de transição, para garantia da receita de tais estados em especial no período de transição para o novo modelo tributário: serão criados o Fundo de Desenvolvimento Regional (com aportes financeiros feitos exclusivamente pela União, de 8, de 16, de 24, de 32 e de 40 bilhões de reais, respectivamente de 2029 a 2033) bem como o Fundo para Compensação de Benefícios Fiscais (também com recursos da União, de 08, de 16, 24, 32, 32, 24, 16 e 8 bilhões, de 2025 a 2032, respectivamente).
Semelhantemente às atribuições do atual CONFAZ – Conselho Fazendário dos Estados, mas com independência funcional ampliada, será criado um Conselho Federativo, para fins de gestão do IBS.
Também, pela proposta aprovada há previsão de implementação de modelo de “cashback”, com a devolução de parte do imposto pago pela camada de menor renda da população, a exemplo do que atualmente ocorre com o Programa “Nota Fiscal Gaúcha”.
Quanto às alíquotas de tais novos IVA, há previsão de uma alíquota padrão (ainda não definida, o que se dará por meio de lei complementar), cobrando integralmente o imposto; uma segunda alíquota que corresponderá a 40% da alíquota padrão, para setores sensíveis da economia, a exemplo dos setores da saúde, educação, transporte e, por fim, uma terceira alíquota, de valor zero, para casos específicos, a serem definidos pela via da lei complementar.
No que tange à alíquota zero, se têm as seguintes previsões:
Alíquota zero de CBS:
– Cesta básica nacional a ser definida por lei complementar. Atualmente, cada estado tem sua composição.
– Medicamentos para tratamento de doenças graves;
– Serviços de educação de ensino superior: Prouni;
Alíquota zero de IBS e CBS:
– Pessoas físicas que desempenhem atividades agropecuárias, pesqueiras, florestais e extrativistas vegetais in natura;
– No caso de produtor rural pessoa física, isenção de IBS e CBS vale para quem tem receita anual de até R$ 2 milhões. O produtor que recebe menos que esse valor por ano poderá repassar crédito presumido (tipo de compensação tributária) aos compradores de seus produtos.
Por via de emenda ao parecer original, foi incluída previsão de que as empresas beneficiadas pelo PERSE – Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos não estarão sujeitas ao IVA – CBS e IBS até 28/02/2027.
A reforma tributária traz previsão de possibilidade de isenções itens e serviços específicos, tais como dispositivos médicos, itens de cuidado à saúde, etc.
Também o texto legal prevê a criação de um imposto seletivo, a incidir sobre bens ou serviços prejudiciais à saúde a serem definidos em lei complementar, em substituição ao IPI.
Tal imposto seletivo implicará em sobretaxa sobre produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente. Incidirá sobre cigarros e bebidas alcoólicas, com possibilidade de ser estendido para alimentos e bebidas ricos em açúcar. Originalmente, substituiria o IPI, mas será um imposto à parte, sendo que parte da arrecadação será usada para manter Zona Franca de Manaus. Insumos agrícolas, que se beneficiam do redutor de 60% da alíquota, não poderão ter Imposto Seletivo. O governo negociará, em lei complementar, possibilidade de que imposto incida sobre agrotóxicos e defensivos.
A efetivação integral da nova modalidade tributária por parte do contribuinte em princípio se dará em 08 anos, com incidência de “alíquotas teste” a partir de 2026. Convém pontuar que se modificações na tributação do consumo aumentarem arrecadação geral, dispositivo no texto prevê a redução das alíquotas do IBS e da CBS.
Em 2027, serão extintos o PIS e a COFINS e reduzidas a zero as alíquotas do IPI, exceto as dos produtos que tenham industrialização na Zona Franca de Manaus. Entre 2029 a 2032, as alíquotas do ICMS e do ISS serão gradualmente reduzidas, à razão de 1/10 por ano, até a extinção desses impostos.
No que tange ao SIMPLES NACIONAL, Zona Franca de Manaus e Áreas de Livre Comércio, tais sistemas e regramentos serão mantidos.
Também consta do Projeto Aprovado dispositivo que autoriza estados e distrito federal a instituir uma contribuição sobre produtos primários e semielaborados produzidos em seu território (tais como petróleo, minério de ferro, gás, energia, etc.), com vistas a financiar fundos estaduais destinados a investimentos de infraestrutura e habitação, com vigência máxima até 2043.
Regimes tributários específicos são previstos para os segmentos de:
– Combustíveis e lubrificantes: neste caso, haverá cobrança monofásica (em uma única etapa da cadeia), alíquotas uniformes e possibilidade de concessão de crédito para contribuinte;
– Serviços financeiros, seguros, cooperativas, operações com imóveis, planos de assistência à saúde e apostas: haverão alíquotas específicas, tratamento diferenciado nas regras de creditamento (aproveitamento de créditos tributários) e na base de cálculo; e tributação com base na receita ou no faturamento (em vez do valor adicionado na cadeia);
– Serviços de hotelaria, parques de diversão e parques temáticos, restaurantes e aviação regional: poderá Lei Complementar prever hipóteses de alterações nas alíquotas e nas regras de creditamento, admitida a não aplicação do disposto no § 1º, V a VIII;
– Operações com bens móveis;
– Compras governamentais: isenção de IBS e CBS, caso seja admitida a manutenção de créditos tributários de operações anteriores; repasse integral da arrecadação do IBS e da CBS recolhida ao ente público contratante (União, Estado ou município), e
– Sociedades cooperativas.
No que pertine ao IPVA – Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotivos, IPTU – Imposto sobre Propriedade Territorial Urbana e ITCMD – Imposto sobre Transmissão Causa Mortis ou Doação, há as seguintes previsões no texto legal:
Quanto ao IPVA, não terão incidência do imposto aeronaves agrícolas e de prestador de serviços aéreos a terceiros, devidamente certificado, algumas embarcações destinadas à pesca industrial, artesanal, científica e de subsistência, maquinário agrícola. Observe-se que até então aeronaves e embarcações de passeio não eram submetidas ao IPVA, passando a ser pela reforma.
Quanto ao ITCMD a principal mudança é a previsão de cobrança progressiva em razão dos valores dos bens, deixando de ser alíquotas fixas, ou determináveis por cada estado da federação. Outra mudança é a previsão que passou a ter para incidência sobre bens herdados do exterior. A competência do imposto é o do domicílio do de cujus. Também resta previsto, mantendo previsão já existente na legislação anterior, Isenção sobre transmissões para entidades sem fins lucrativos com finalidade de relevância pública e social, inclusive as organizações assistenciais e beneficentes de entidades religiosas e institutos científicos e tecnológicos.
No que tange ao IPTU, a base de cálculo passa a poder ser definida por decreto municipal, sem necessidade de deliberação do legislativo.
Em regra, um imposto é criado e vinculado a uma finalidade por lei. Mais recentemente, e este ponto resta também consta do projeto aprovado na Câmara, há previsão de prorrogação de 31 de dezembro de 2023 para 31 de dezembro de 2032, da desvinculação de 30% de receitas dos impostos, taxas e multas já instituídos por estados e municípios ou que vierem a ser criados até essa data, e de outras receitas correntes.
Por meio de tal previsão, se permite que até 30% da receita do IBS não seja vinculado por lei, com exceção de algumas finalidades, como gastos mínimos em saúde e educação ou Fundeb.
É de se pontuar que restou fora do projeto dispositivo que prorrogava de 31/12/25 até 31/12/32 benefícios de crédito presumido de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), na venda de veículos, tratores e outras máquinas rodoviárias produzidas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste (Sudam e Sudene).
Há dispositivo no texto legal que prevê desoneração da folha. Nesse caso, a partir da desoneração da folha a alguns setores da economia acaso ocorra uma eventual criação de mais empregos, resultando em maior arrecadação, esse aumento deve ser usado para reduzir a tributação do consumo de bens e serviços. Nessa hipótese, demais setores não incluídos na desoneração poderão também ser beneficiados.
Por fim, destacam-se pontos que foram incluídos de última hora no projeto aprovado na Câmara:
– Autorização para estados e Distrito Federal criarem tributo local sobre produtos primários e semielaborados para financiar investimentos até 2043. Até agora, prerrogativa era da União;
– Ampliação da imunidade tributária para igrejas: de “templos de qualquer culto”, a medida agora abrangerá “entidades religiosas, templos de qualquer culto, incluindo suas organizações assistenciais e beneficentes”;
– Inclusão de setores com alíquota reduzida de 60% no IVA: produtos e insumos aquícolas, atividades desportivas e cibersegurança;
– Retomada do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse);
– Isenção ou alíquota zero para reabilitação urbana de zonas históricas e de reconversão urbanística;
– Obrigatoriedade para que Ministro da Fazenda compartilhe informações, inclusive protegidas por sigilo fiscal, para Senado calcular alíquotas de referência;
– Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais, criado para manter benefícios, também compensará montadoras e fabricantes beneficiárias do Programa Rota 2030, que será prorrogado até 2032.
A integral reforma tributária passará por uma segunda fase, que tratará dos impostos sobre a renda, com previsão temporal já constando desta primeira etapa, de encaminhamento em até 180 dias ao Congresso, a partir da promulgação da PEC nº 45/19. O implemento desta segunda fase pretende o aumento da arrecadação, com a finalidade ato contínuo de redução da tributação incidente sobre a folha salarial e sobre o consumo de bens e serviços.
Fontes: Jota.Info e InfoMoney.
Aulisson Pereira, Advogado.
Berto Rech Neto, Advogado.
Caxias do Sul, julho de 2023.